BEM VINDOS

Somos um grupo de RPG que está jogando uma campanha há 11 anos, o sistema de regras que uso é de criação minha e devido ao gênero de jogo a batizei de HORROR. Em todo esse tempo dentro do jogo aconteceram muitas coisas que gostaríamos de imortalizar e a melhor maneira que encontramos para fazer isso foi tranformar o jogo em uma história dinâmica. A história que começa nesse espaço é o inicio do quarto ano que começamos em 2007, a cada sessão de jogo transcrevemos todo o acontecido em forma de história para gravarmos em nossas memórias a angustia vivida pelas almas de cada um e compartilharmos com aqueles que apreciam o gênero. Ao lado direito da página na seção "cada dia uma angústia" a história começa no dia 23/09/2005.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

2012

ANO DE 2012


O TERCEIRO APOCALÍPSE

Depois da situação no Lenox Hill Hospital, Adotamos uma nova política. Ficávamos por volta de seis meses em um local e nos mudávamos. Às vezes a guerra nos alcançava antes e nunca optávamos por defender o local para permanência. A rede sempre tinha dois ou três locais em vista para uma fuga e nossos recursos apesar de poucos, eram preciosos. Assim íamos vivendo esta nova realidade medieval... Feudos lutando entre si, comunidades sendo destruídas, as ruas cheias de cadáveres... Lá se foi à utopia de muitas pessoas que acreditavam que agora as pessoas seriam mais cooperativas e seria tudo diferente. O que havia de pior na natureza humana estava novamente vindo à tona.

Nós estávamos alojados em um prédio de Manhattan. Estava cada vez mais difícil conseguir parcerias para dividir bons locais, então já fazia algum tempo que agíamos sozinhos. Infelizmente foi necessário lutar com outras pessoas, mas não há arrependimentos pelas suas mortes neste caso. Uma comunidade desprezível, cheia de degenerados. Pessoalmente meu sangue ferveu ao constatar que eles escravizavam mulheres, com a mesma desculpa esfarrapada daqueles soldados de seis anos atrás. Como eu disse, sem arrependimentos por suas mortes e de quebra ajudamos três mulheres, sendo que a mais nova delas estava grávida de quase oito meses. A imagem delas acorrentadas na parede ficou muito tempo na memória. Só realmente esqueci aquele dia quando a criança daquela mulher nasceu. Eu pessoalmente fiz o parto e felizmente não tinha nenhum traço do pai.

Lembro bem daquela manha no dia dois de fevereiro. Parecia ser um dia tão bonito... Sol entrando pelas janelas, uma brisa agradável e todos pareciam sentir isso também. Samuel e Gabriela partilhando o café da manha entre beijos e carinhos, Victor e Tamara conversando amenidades animadamente e até mesmo contando piadas, Esperança parecia ainda mais elétrica em seus seis anos de vida e já corria pelos corredores com a sua pequena trupe no encalço. Era engraçado ver que as outras crianças a viam como uma irmã mais velha, alguém que deveriam seguir. Esperança era assim, tinha uma personalidade muito forte e um tino quase natural para liderar. A rede retornava de uma exploração bem sucedida com alguma comida, quinquilharias e até mesmo alguns remédios. Tudo prometia um dia bom para todos...

Então porque eu estava tão nervosa?

Acordei de um sonho perturbador, pois estava suando muito e ofegante. Lembrava apenas das imagens de alguns horrores antigos, mas nada específico. Após o café, as coisas pareciam tão tranqüilas que acabei ficando um pouco nervosa. Não estava mais acostumada com épocas de calmaria. Era como se a qualquer momento o destino fosse nos surpreender com mais problemas ou desgraças. Eu estava ficando paranóica.

“Preciso me acalmar. Não é a primeira vez que temos dias assim e não consigo aproveitar por causa dessa paranóia. Chega! Vou aproveitar enquanto eu posso. Lutamos por dias assim afinal.”

Imbuída neste pensamento e um pouco de água no rosto, mudei de atitude. Procurei Esperança e brinquei com ela como há muito tempo não fazia. As crianças em volta também aproveitaram minha boa disposição. Como corremos! Duas horas fazendo brincadeiras, sem preocupações e sem lembrar que estávamos no meio de uma guerra. Tamara que apesar de seus dezenove anos ainda tinha muito daquele espírito da criança de treze, juntou-se a diversão. Mal nos demos conta quando chegou a hora do almoço. O refeitório em si estava apinhado como sempre, então decidi fazer algo diferente. Peguei a parte de comida que cabia a mim e Esperança e fui ao terraço do prédio. O sol a pino tornava a temperatura agradável e não havia quase ninguém lá. Estendi uma velha toalha de mesa no chão e almocei junto com Esperança. Havia alguns pequenos agrados que só poderia fazer longe de todos, como alguns temperos e quitutes que ficavam guardados para momentos como aquele.

Como num flash, eu voltei para dias mais felizes de minha infância, quando almoçávamos nos Domingos ao ar livre. Sempre me perguntava como a minha mãe se sentia naqueles momentos e agora eu sabia. Uma mistura de felicidade e orgulho ao ver minha filha sorrindo, comendo aquilo que preparei especialmente para ela, saudável como nenhuma outra criança no mundo. E Esperança era especial, ninguém podia negar isso. Foi uma agradável hora e meia. Estava deitada na toalha junto com Esperança e nós duas dormitávamos. Ouvi a porta de emergência contra fogo se abrir e por um momento vi a imagem de meu Pai descendo da fazenda com algumas frutas maduras, Eu fingindo dormir e o olhar apaixonado de minha mãe ao olhar para ele. Devo ter feito o mesmo olhar, pois Samuel veio até mim com um olhar deveras constrangido. Não nos viu nos lugares de costume e ficou preocupado... O bom e fiel Samuel! Quando me dei conta, Esperança já se jogava em cima dele para uma brincadeira que ela adorava fazer e só com Samuel, um tipo de luta fingida que sempre acabava em abraços e roladas pelo chão. Dei-me conta do quanto os dois são parecidos e do quanto um momento como aquele me faz falta. Uma lágrima desceu pelo meu rosto e rapidamente pisquei, como acordando de um sonho. Podia ver na expressão dele que precisava falar comigo a sós.

- Minha filha, pode nos dar um momento? Eu e o tio Samuel precisamos conversar...

- Coisas de Adulto?

- Sim... Coisas de adulto.

Ela nos abraçou e desceu pelas escadas. Passou pelo menos um minuto antes de algum de nós tomarmos a Iniciativa.

- Ela não é a menina mais preciosa desse mundo?

- É sim. Só lamento pelo destino que ela pode ter.

- Não lamente. Ela não poderia ter um pai melhor.

- Não diga isso...

- Vocês são tão parecidos... Quanto tempo acha que vai levar até alguém perceber?

- Eu não sei. Mas eu só vim por que...

- Queria vê-la. Realmente fazia tempo que não dedicava tempo a sua filha. Gabriela toma tanto assim seu precioso tempo?

- Eu ia dizer que estava preocupado, pois não vi vocês La dentro... E quanto a Gabriela achei que já tínhamos conversado.

- Eu sei Samuel... Eu sei.

Sentia meus olhos umedecerem. Olhei para Samuel que me olhava também. Não ia agüentar mais... Precisava dizer.

- Mas é demais querer uma família para a sua filha? Eu quero que olhe para mim Samuel... Olha e me diz o que vê.

- O que eu vejo? Uma sobrevivente, uma grande companheira, mãe da salvadora, a mulher que jurei perante o céu e inferno que protegeria!

- Só isso?

- Como assim? Isso não te basta?

- Não me veja como a Santa Laura droga! Veja-me como mulher! Pelo menos uma vez... Em sã consciência!

Comecei a me aproximar dele. Ele não sabia se recuava ou ficava onde estava.

- Laura... Gabriela pode aparecer a qualquer momento. Não torne as coisas ainda mais difíceis.

- Olha nos meus olhos e diz que não sente nada por mim!

Ele ficara parado, me olhando nos olhos. Não saberia dizer se sentia alguma coisa, pois não expressava nada. Talvez isso fosse mensagem clara o suficiente, mas eu estava obstinada. Um beijo... Apenas um, e provaria que estava certa! Meus lábios estavam cada vez mais próximos e foi quando estava a um centímetro dos lábios dele, um relógio antigo anunciava em algum lugar...

13h41min PM. O dia que o mundo viu o terceiro apocalipse.

Uma lufada de vento nos atingiu com muita força, pelo menos mais força que o vento deveria estar. Primeiro senti um frio na espinha e logo estava abraçando Samuel, buscando apoio. Olhei para seu rosto que expressava surpresa, medo, horror. Voltei-me para onde ele olhava e passei a compartilhar do pavor. Uma gigantesca coluna de fumaça se erguia de onde seria Washington, como um enorme cogumelo. Demorou apenas um segundo para nós que havíamos visto de muito perto uma explosão daquelas... Uma explosão nuclear. Uma bomba atômica acabava de explodir em Washington.

Mal tivemos algum tempo para absorver a primeira informação, outra explosão acontece para os lados da Pensilvânia. Em um Ímpeto único de Instinto de sobrevivência, Samuel me agarra pelo braço e me puxa para dentro do prédio. Corríamos escada abaixo na direção de nossos quartos e podíamos ver o desespero que começava a tomar conta de todos.

Algumas pessoas pegando o que podia e correndo para fora do prédio, outros procurando um porão e outras simplesmente paralisadas de medo. Em um estalo, lembrei de Esperança. Comecei a correr tanto quanto Samuel. No meu quarto, Esperança não estava. Então peguei minha única mochila e disparei pelo corredor. Disse ao Samuel que nos encontraríamos em Dois minutos na picape e nos dividimos para achar os outros. Encontrei Gabriela no caminho e disse para ela encontrar Samuel na Garagem. Victor e Tamara já deviam estar lá. Era um plano que tínhamos entre nós... Qualquer emergência era pegar os pertences e ir ao carro. Esperança também deveria lembrar-se disso, mas eu ainda assim me preocupava. Fui encontrá-la com aquele mesmo grupo de crianças menores, mas ela parecia atenta ao redor, como se procurasse alguém.

- Esperança! Eu estou aqui! Vamos filha!

- Só um pouco Mãe!

- Mas o que esta dizendo? Não há tempo! É uma emergência lembra?

- Estou fazendo o que você disse!

- O q...

Uma mulher aflita olhou para as crianças e veio rapidamente. Pegou uma das meninas que estava com Esperança, agradeceu rapidamente e saiu. Ela estava ajudando as crianças a encontrar suas mães! Vieram mais três mulheres e elas levaram o restante das crianças. Esperança corre até mim e eu a pego no colo. Enquanto corro para a garagem, ouço-a falar no meu ouvido:

- Esta brava comigo?

- Estava preocupada minha filha. Combinamos que você iria para o carro do Victor sempre que acontecesse um problema.

- Eu sei, mas eu tinha que ajudar. Você não disse que as crianças são o futuro? Que sem elas, os adultos não viveriam?

Eu tinha dito isso para uma mãe que estava tendo problemas em aceitar um filho gerado de estupro, o que não era incomum infelizmente. Só não sabia que Esperança ouviu aquilo. Podia jurar que estava dormindo...

- Eu não queria que aquelas moças morressem, então Levei todos para elas... Fiz errado?

- Não querida... Estava certíssima.

Como argumentar contra suas próprias palavras? Era ótimo ver que Esperança aprendia depressa absorvendo o conhecimento que se apresentava. Isso poderia ser um problema mais tarde, mas ela precisaria estar viva para poder se preocupar. Ao atravessar corredores e descer escadas, podia presenciar os mais diversos tipos de desespero. Cada pessoa que deixava para trás era uma pontada de remorso. Eu queria ajudá-las, queria poder encaminhar todas para os seus Veículos para encontrá-los seguros e vivos no dia seguinte... Mas Esperança precisava viver. Muitos pesadelos eu teria com aqueles rostos sem nome que não teriam sido fortes o bastante ou simplesmente não tiveram sorte de sobreviver ao que viria a seguir.

Um minuto depois eu alcançava a garagem externa, onde todos estavam presentes e lutando contra a maré de desesperados para manter o carro. Empurrei muitos, passei por cima de outros, chutei uma dezena de pessoas, mas cheguei à velha picape modificada. Victor pisou fundo no acelerador e desviando de muitos obstáculos até chegar à avenida.


Era possível ver, para quem olhasse para cima, Um rastro de fumaça branca rasgando os céus e um projétil parecido com um míssil ou um foguete a poucos quilômetros acima. Perto demais de onde estávamos! Não daria tempo para nos afastar e nem para onde ir... A não ser para baixo!

Gabriela apontou aos gritos para a passagem de metrô e Victor não hesitou... Colocamos os cintos segundos antes de ele mergulhar pela passagem onde deveria passar apenas pedestres. Sacudidas violentas enquanto descíamos e apesar de alguns hematomas, estávamos inteiros e o carro continuou andando até a plataforma de embarque. Com uma habilidade na direção que já havia demonstrado outras vezes, evita os pilares e outros obstáculos, deixando o carro próximo dos trilhos. Saímos o mais rápido possível, pegando tudo que tínhamos trazido de qualquer jeito e corremos pelo túnel adentro. Nossas lanternas iluminavam parcialmente o largo túnel enquanto nos afastávamos da estação. Gabriela procurava por alguma coisa junto com Samuel nas paredes e encontram o que procuram alguns segundos antes do primeiro impacto da arma nuclear que acabava de atingir a ilha de Manhattan.

As lanternas se apagaram... Apenas escuridão e depois a explosão. Não a presenciamos obviamente, mas a sentimos em cada parte de nossos corpos. O calor da energia que se espalhava, o tremor de coisas ruindo, o grito abafado de Esperança encolhida e abraçada a mim... Mas eu podia sentir outros corpos em cima mim, quase como um casulo humano. Eram todos tentando proteger Esperança... Se alguém tinha que viver, era ela. Toda precaução era necessária, apesar da sala com porta de chumbo. Sim, esqueci de mencionar que o que Gabriela e Samuel procuravam era uma das salas de manutenção dos túneis. Um local escavado no concreto e com pesadas portas de metal. Foi o melhor que conseguimos arranjar. Só restava a nós ter fé.

...

Passei muito tempo naquele calor humano, abraçando Esperança que continuava dormindo, até eu mesma adormecer. Não tinha percebido o quanto eu estava cansada até constatar que a explosão tinha ocorrido, os tremores tinham cessado e até mesmo o calor emanado do lado de fora tinha abrandado. O local tinha um tipo de sofá velho e para falar a verdade nem lembro direito como fui parar ali. Acordei deitada naquele sofá e por um momento fiquei desesperada, pois esperança não estava no meu colo. Ao colocar os pés no chão, quase piso em algumas pessoas amontoadas que também estavam dormindo. Agora havia alguma luz ali dentro, feita com tochas improvisadas e pude perceber que aquela era uma espécie de sala de estar, com um sofá, um armário em um canto, uma pequena mesa e até mesmo um aparelho de TV e um rádio portátil. Além do pequeno corredor que dava para a porta da entrada, havia outro corredor na parede oposta. Tomando cuidado para não pisar em ninguém, entrei no corredor sombrio. No meio dele, havia uma porta fechada e outra ao final do corredor. Nesta ultima porta eu percebia movimento e sons, então fui direto a ela. Não havia maçaneta e estava entreaberta, então entrei...

- Mãe!

Olhei para o lado do grito e vi Esperança correndo em minha direção. Recebi-a em meus braços. Estava aliviada em ver que ela estava bem.

- Tudo bem querida?

- Tudo! Quer café? Tio Samuel tava fazendo o café que encontrou...

Olhei mais detidamente a minha volta. Uma mesa grande de madeira ocupava a maior parte da sala. Em um dos cantos, uma porta e um balcão como aqueles de Buffet livre. Obviamente aquele era o refeitório. Victor, Tamara e Gabriela estavam sentados em cadeiras numa ponta da mesa. Samuel saia pela porta, trazendo um bule fumegante. Esperança me puxava para uma das cadeiras e acabei sentando entre ela e Samuel.


- Dormiu bem Laura?

- Sim... Acho que sim... O que eu perdi?

- Apenas o fim do mundo minha amiga.

- Que bom... Não queria ver mesmo. Quem são aqueles atirados ali na outra sala?

- Sobreviventes. Começaram a entrar logo depois de nós. Foi uma briga para fechar aquela porta que tu nem imagina!

- Vi que tinha outras pessoas, mas não havia mais tempo... Vi o brilho da energia nuclear e começamos a fechar a porta.

- Espera aí... Eu nem reparei nisso tudo.

- Estava jogada num canto com a Esperança abraçada em você... Fez o que era certo! Por isso nos jogamos em cima de você também...

Samuel interrompe a narrativa ao olhar para mim e ver que eu estava sorrindo. Pessoalmente acreditava que apenas Samuel teria usado seu corpo para me proteger e vendo o que ele fazia os demais o imitaram. Claro que não iria dizer isso.

- Obrigada. Espero que ninguém tenha se machucado.

Tamara - É um milagre mesmo, mas todos estão inteiros!

- Menos quem ficou La fora...

Victor fazia o sinal da cruz. O silêncio tomou conta do refeitório até que Tamara resolve quebrar o gelo.

- Foi muita sorte a gente encontrar esse lugar aqui.

- Sorte em parte. Eu sabia da existência destes túneis, mas não sabia se encontraria um deles em tempo. Quem diria que saber do sistema de túneis poderia ser tão útil não é?

- Mas o que é este lugar tia Gabriela?

- Durante a construção dos túneis, estes lugares eram para o descanso dos trabalhadores menina. Repare que a maioria dos móveis é de algumas décadas atrás. Talvez outras pessoas Utilizassem essa sala depois disso, mas o importante é que por ser cavado bem fundo no concreto e pela porta de metal grossa, tínhamos uma chance.

- Pensou rápido. Aprendeu bem com os federais... Ou sabe-se lá qual agencia você teve.

- É impressão minha ou senti certa hostilidade aqui?

- Hostilidade? Porque Gabriela? Só porque todas as agências do mundo nos perseguiam? Tanta sigla que uma hora eu tinha que esquecer... FBI, CIA, KGB, ABC, AEIOU...

Esperança começou a rir das minhas agencia fictícias e logo estávamos todos rindo. Talvez mais pela ironia do fato de não haver mais governos ou agências do que pela piada.



- Mas e agora? O que fazemos?

- Sair agora não dá. Deve ter muita radiação La fora.

- Parte da Porta de saída derreteu e ela ainda tava quente há algum tempo atrás quando fui verificar.

- Então não temos escolha, correto? A nossa sorte foi ter encontrado uma despensa cheia, embora meio vencida. Juntando com o que a gente tem, agüentamos alguns meses racionando comida. O problema são aqueles lá fora.

- Já pensei nisso... Com aquele monte de Gente ali na sala não vamos agüentar dois meses.

- O ideal seria agüentar um pouco mais para elevar a segurança de não sermos contaminados. Tem alguma água que espero não estar contaminada.

- Mas o que fazer em relação às pessoas?

Mais silêncio perturbador. As possibilidades que pareciam surgir não me agradavam nem um pouco.

- Estão pensando em... Não! Eu me oponho!

- Acalme-se Laura! Apesar de mortes necessárias terem passado pela minha mente, eu percebi que não seria uma idéia boa afinal. Muitas conseqüências desagradáveis para mente e para o corpo.

- Concordo. Vamos ter que economizar energia e recursos ao Maximo, mas é possível sobreviver por algum tempo. Todos deverão colaborar e nós teremos que dar o exemplo.

Nisso todos concordavam. Algum tempo depois, as pessoas na sala de estar despertavam e recebiam todas as notícias. Havia cerca de quinze pessoas ali. Homens e mulheres entre vinte e quarenta anos, algumas crianças que não passavam dos dez anos e até mesmo um casal de Idosos. Éramos vinte e uma pessoas tentando sobreviver no que seria equivalente a um apartamento JK, o que gerou muitos problemas inevitáveis. Houve intrigas, brigas abertas, traições, doenças, as batidas perturbadoras na porta de saída causadas por criaturas que não sabíamos se eram as mesmas de antes ou pessoas que sobreviveram ao ataque nuclear. Nunca ninguém conseguiu entrar vindo de fora. Nós poderíamos sair com a ajuda de algumas ferramentas que havia La dentro, mas sempre se pensava que ainda era muito cedo para sair e se postergava o dia da saída.

Muitos dias haveriam de passar... Dias que pareciam anos. Era como se estivéssemos numa prisão, mas nós éramos nossos próprios carcereiros. O medo do que poderia haver La fora superava todo o sentimento de liberdade que poderíamos ter. Só não perdíamos a noção do tempo por causa de meu diário, que ficava cada vez menor. As folhas logo vão acabar assim como a paciência da maioria das pessoas.

Um dia, houve uma grande reunião geral. A comida afetivamente acabou, salvo pequenas reservas pessoais, assim como a água. Um pouco mais de dois meses haviam passado e a pressão era cada vez maior para ir atrás de mantimentos. Naquele mesmo dia, decidiu-se pela abertura da porta e a mesma foi arrombada a marretadas, picaretada e outras ferramentas. Sorte nossa que era dia e podíamos ver uma fraca luz solar. Nosso carro ainda estava lá na plataforma, em parte destruído e em parte inteiro. Subimos as escadas para o céu aberto.



A ilha de Manhattan se transformou em entulho. Não parecia haver nada vivo em milhares de quilômetros e tudo estava em estado de decomposição. A partir Dalí nada seria o mesmo. Nunca ficou claro o porquê destas bombas nucleares, mas o que importava é que mais essa provação nos foi imposta. Não saberíamos como sobreviver, mas a raça humana já sobreviveu a coisas igualmente desastrosas. E sobreviverá a mais isso. Estas são as ultimas linhas de meu velho diário e não poderei escrever por um bom tempo. Espero poder encontrar algo para escrever e principalmente histórias para preenchê-las. Serão tempos difíceis, mas pela minha filha, pela ultima Esperança que ainda arde nos corações daqueles que tem fé, estaremos vivos.

“Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte não temerei mal algum, pois deus está comigo!”




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